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Mulheres e seus vestidos



Tubinhos, pretinhos básicos, com e sem alça, os brejeiros de chita. E o tomara que caia, amigos, você já testemunhou a queda de pelo menos uma alça dessas na vida?

É lenda. Por mais que a gente se quer, nunca vi uma peça do gênero despencar na minha frente.

Ei, você ai, de cabelos brancos na fronte do artista, você mesmo, rapaz, deve se lembrar muito bem daquele que Sonia Braga vestia quando escalou o telhado, em Gabriela Cravo e Canela, no tempo em que rolava a novela das dez.

Alvíssaras, meus camaradas, os vestidos voltaram com tudo. A vingança. Não que tivesse sumido da historia, das ruas, das festas, repartições e firmas. Mas andavam em baixa, suplantados pela praticidade burocrática das Evas modernas e suas calças, suas saias austeras e seus tailleurs, essas peças apolíneas que batem a carteira de Venus, roubam a alma de Eros.

De tão neoliberais, os tailleurs são capazes de sair sozinhos para o trabalho. Talvez tenha sido necessários, fazer o quê? A onda recente de desfiles de moda de Nova York, Londres, Milão e Paris, para alertar para uma necessidade mais do que extremada:  o retorno do vestido como peça sagrada e quase segunda pele das mulheres. 

Tudo fica mais estranho ainda quando as passarelas começam a entender um pouco os homens héteros. Mas não deixa de ser um ótimo sintoma dos tempos. Quando estudo minha voz interior falar em sintoma dos tempos dá uma vontade louca de meter um tiro no coco para acabar de vez com essa sacanagem nostálgica e precoce, mas vamos simbora, esquece.

Talvez a industria da moda esteja pagando por todos os pecados anteriores. Redime-se lindamente do quanto enfeiou as belas mulheres.

Nada nos cai tão bem ao desejo quanto um vestido.

Todo homem ama passear com uma mulher com a mais linda dessas peças. Mesmo os mais machões, que fingem ignorar a vestimenta da fêmea – reservando-se apenas a dar chiliques quando as vestes são muito curtas, amém, perdoai-vos eles não sabem o que desejam.

Seja um Versace, que custa os olhos da cara, seja um baratinho de chita.

Homem que é homem, seja de Paris, Nova York ou do sertão dos Cariris, como o meu avô João Patrilino, vai a Maison, às Casas Pernambucanas ou à feira do seu município e traz uma bela peça ou um corte de tecido de presente para amada. Até mesmo o Fabiano, que mal tinha um cobre no bolso, personagem do livro Vidas Secas, de Graciliano Ramos, mestre-mor da escritura, voltada da cidade com um corte de pano estampado para a sua mulherzinha magra, só o coro e o osso, recostela mais bíblica. V de verão e V de vestido para deixar mais faceiras as gazelas, para dar mais graça às cheinhas, para realinhar a beleza nobre das afilhadas do gordinho Balzac.

A peça nos põe, homens de todas as gerações e gostos, mais românticos. O mais tosco dos canalhas sucumbe como um romeiro de joelhos diante de Nossa Senhora Aparecida.

Ora, você nem carece ser mais bela por completo, isso é utopia e ditadura de modas ee modinhas, você carece ter apenas uma linda parte pelo todo, como aquela figura de linguagem, a tal da metonímia que aprendemos no colégio.

Mulher é parte do todo. Uma linda omoplata, um pescoço, ombrinhos, pés, calcanhares mais lindos, baratas de pernas invejáveis, belos braços...

Ai ficará mais linda de vestido, ao contrario das calças e outras tantas armaduras medievais que escondem o que nos enlouquece, o melhor dos nossos mundos.

Esconder, achando que pode ser vantajoso depois, é besteira. O charme é mostrar-se, ter a coragem, mesmo com o que você supõe ser uns quilinhos a mais. Na balança das nossas retinas e trenas, isso pode ter importância de menos, quase nada, alguns gramas de preconceito e veadagem na cabeça de homens que já não avaliam mais a pena.

O bom mesmo é cantar como  o Rei: “vista a roupa, meu bem, e vamos nos casar”, minha pequena.

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