O projeto de
pesquisa intitulado “Aspectos psicossociais no contexto da pandemia de
coronavírus (Covid-19) no Brasil” está em processo de análise de dados, mas já
possui um artigo submetido a uma revista científica.
Nesta
análise parcial algumas constatações já foram produzidas e podem ser destacadas
duas delas: uma referente à crença na eficácia do isolamento social; e outra
vinculada à percepção de custos econômicos relacionados à prevenção da
Covid-19.
Em relação à
crença na eficácia do isolamento social, foi evidenciado que o posicionamento
político-ideológico (contínuo esquerda-direita) é relevante na postura dos
participantes. As pessoas que se aproximam mais a posicionamentos ditos de
“direita” tendem a acreditar menos na eficácia do isolamento social. Por sua
vez, as pessoas mais próximas ao campo da “esquerda” demonstram tendência a
acreditar mais em tal eficácia.
No que diz
respeito à percepção de custos econômicos relacionados à prevenção da Covid-19,
um conjunto de variáveis psicopolíticas se mostrou relevante, em especial:
traços autoritários.
Houve uma
forte relação entre pessoas que demonstraram traços autoritários (submissão
autoritária; agressão autoritária; convencionalismo; e pensamento
supersticioso) e uma maior preocupação com custos econômicos ligados à
prevenção do coronavírus. Também houve importante vínculo entre traços
autoritários e apoio aos pronunciamentos do presidente Jair Bolsonaro.
“Muitas vezes acreditamos que nossas
escolhas são pautadas por análises racionais e individuais. Supostamente nossas
atitudes seriam fruto do conhecimento objetivo da realidade. No entanto, o que
os dados preliminares – em consonância com várias outras pesquisas - demonstram
é que há muitas outras variáveis compondo a formação de nossas atitudes. A
crença na eficácia do isolamento social se relaciona ao grupo político ao qual
o sujeito se identifica. Podemos entender que ela não é apenas uma escolha
individual baseada em sua racionalidade, mas que a forma como se vê a realidade
é permeada também pelo grupo social ao qual a pessoa se filia”, explica o
professor Leandro Rosa.
Ou seja, por mais que as decisões sejam tomadas pelas pessoas enquanto indivíduos, as identidades sociais constituem a maneira como elas pensam e sentem a realidade.
Também no
que se refere à percepção dos custos econômicos da prevenção da Covid-19, a
pesquisa mostra que não é apenas a racionalidade e o conhecimento objetivo da
realidade que compõem a posição dos participantes. Os traços autoritários – ou
a ausência deles - contribuem na maneira com que a pessoa percebe e entende a
realidade.
“Cabe
destacar que os traços autoritários constituem e são constituídos pelas
identidades políticas que mediam nosso contato com o mundo. Novamente o sujeito
toma sua decisão, no entanto é uma ilusão imaginar que tal postura é fruto de
uma relação direta com a realidade”, diz o professor Marcelo Xavier de
Oliveira.
A posição de
cada pessoa relacionada a esse tema é permeada por diversas variáveis
psicossociais e, como mencionado, entre elas se
destacaram os traços autoritários. Assim, aponta professor Gustavo
Henrique Carretero, em casos como este parece
pouco eficaz tentar produzir mudanças de posição apenas por meio de argumentos
lógicos e dados objetivos, pois a percepção é composta também por elementos
psicopolíticos que podem ser imunes a esses estímulos.
“É
importante destacar que nenhum de nós está imune a essa produção psicossocial
de percepção da realidade e que há inúmeras outras variáveis de diversas ordens
e dimensões que compõem nossos comportamentos”, destaca a professora Patrícia
da Silva.
Por fim, os
pesquisadores destacam que tais dados, ainda que preliminares, apontam, junto a
outras pesquisas, para a necessidade de reconhecer e melhor compreendermos os
aspectos psicossociais que compõem nossos processos de percepção e formação de
atitudes.
“Em momentos
de crise sanitária e social como o atual, tal necessidade se torna urgente pela
sua capacidade de contribuir para a redução de mortes causadas pela Covid-19.
Diante da pandemia, o ‘vírus da desinformação’ deve ser combatido, mas junto a
isso devemos produzir formas de proteção contra a polarização política e o
autoritarismo que colocam em risco nossa democracia e nossas vidas”, avalia
Leandro Rosa.
Responsáveis pela pesquisa
A equipe que
realiza a pesquisa é formada por Gustavo Henrique Carretero, Leandro Amorim
Rosa, Marcelo Xavier de Oliveira e Patrícia da Silva, professores do curso de
Psicologia da Universidade Federal do Acre (UFAC).