De acordo com o
Ministério da Saúde, a década dos 2000 contabilizou um drama econômico e
social: 5,6 milhões de partos realizados em adolescentes em todo país. A
Organização Mundial de Saúde entende como “adolescente”, nesses casos, toda
mulher entre 10 e 19 anos.
No Brasil, o problema
existe em grandes dimensões em todas as regiões. Sem exceção. A situação é mais
grave nas regiões Nordeste e Sudeste, embora o quadro tenha sofrido uma leve
melhora nos últimos dois anos.
O diagnóstico elementar
da gravidez na adolescência responsabiliza o poder público por uma série de
ausências. Quando uma criança de 10 anos fica grávida, o Estado deixou de atuar
em uma série de frentes de trabalho.
Desde a elaboração de
políticas eficientes de promoção da infância até a criação de um ambiente de
impunidade que possibilita um criminoso abusar sexualmente de uma criança.
Do ponto de vista
social, a dificuldade está em fazer com que todos se sintam responsáveis pelo
problema. Quando uma criança de 13 anos frequenta uma sala de ultrassom com
outra criança pulsando no ventre, há uma responsabilidade de natureza coletiva.
Desde quando o Brasil
passou a ter a maior parte da população morando na zona urbana (a partir da
metade dos anos 70), criou-se uma concepção falsa de que a gravidez precoce é
problema exclusivo das classes mais baixas; ou da abordagem machista que tenta
responsabilizar as adolescentes pelo problema.
É bem verdade que as
classes mais excluídas estão mais vulneráveis. Elas já sentem no cotidiano
outras séries das ausências do poder público. A gravidez na adolescência é
apenas mais um.
Acre
acompanha tendência de queda
O Estado do Acre
acompanha a tendência de queda no número de adolescentes grávidas. De acordo
com o DataSUS, a instância do Ministério da Saúde responsável pelas pesquisas dos
serviços do sistema único, o Acre teve uma taxa de variação no período de 2000
a 2009 de -17,57%.
Essa redução deve ser
comemorada. Significa que menos adolescentes ficaram grávidas. E isso é bom. É
uma das menores reduções do Norte, mas ainda assim uma redução. No mesmo
período, o estado que registrou maior redução, de acordo com o DataSUS, foi
Rondônia com -50,74%, seguido do Tocantins com -27,16% e Amazonas com -21,75%.
A situação mais
complicada é registrada em Roraima onde houve crescimento de 59,96% no número
de partos em adolescentes entre 10 e 19 anos.
“É
difícil ter uma de idade”
A Maternidade Bárbara
Heliodora, a maior unidade maternal pública do Acre, é um bom termômetro para
referendar a queda registrada pelo SUS. Mesmo com a redução, impressiona a
quantidade de jovens que transita pelos corredores.
“É difícil ter uma de
idade” (sic), constatou a agricultora
Maria Raimunda de Oliveira Lima, 43 anos. “Só tem mais jovens” (sic). Ela mesma carrega uma história
muito comum. Teve nove filhos. Seis mulheres. À exceção de uma que morreu,
todas foram mães muito cedo.
Ela acompanha a caçula,
de 15 anos, que deu à luz, no último dia 31 de dezembro, a Nauana Vitória
Oliveira. O pai da pequena Nauana, de 21 anos, acompanha todo o processo. Já
planeja “se juntar” e constituir família.
Maria Raimunda mora com
o esposo no projeto de assentamento Moreno Maia. Como o ramal Paralelo (que dá
acesso à casa de farinha) “está intrafegável”, a filha grávida no último dia do
ano passado quase morre.
A situação só não se
tornou uma tragédia porque fizeram contato com a equipe do Ciosp que acionou o
grupamento do helicóptero João Donato. “Ela tinha desmaiado”, lembra. “Deu
eclamps e ela ia morrer se não fosse ‘o avião’”.
“Meu
filho não é um erro”
A mato-grossense Solange
Rocha de Lima tem 37 anos. Foi mãe pela primeira vez aos 18 anos. Veio para o
Acre há três anos e ainda não se adaptou. A filha, de 13 anos, está grávida de
nove meses. O barulho do coração da criança no ventre foi acompanhado
rotineiramente nos exames pré-natais.
É praticamente
impossível esconder uma situação de conflito entre mãe e filha. “Ela se adaptou
bem até demais”, ironizou a mãe, em tom de uma leve bronca.
Os olhos castanhos da
adolescente, segurando o aparelho que fazia sentir o ritmo cardíaco da filha
que carregava no ventre transmitiam um misto de constrangimento, tristeza e,
paradoxalmente, segurança.
“Meu filho não é um
erro”, anunciou a adolescente, cujo namorado de 17 anos também acompanha a
maternidade de perto. Quando abordada a respeito dos métodos contraceptivos que
teve acesso, foi taxativa. “Foi um acidente”, assegurou, antes de dar o
diagnóstico fatal. “O problema maior foi a falta de diálogo”, disse em um
comedido desabafo.