Em 2014 a descoberta da hepatite C completa 25 anos e para comemorar o aniversario chegam ao mundo os medicamentos de uso oral sem necessidade do triste interferon, que quando aposentado certamente não vai deixar saudades a ninguém.
A hepatite C é uma das poucas doenças crônicas que pode ser curada. Se até o momento depende de um tratamento longo e difícil, com efeitos colaterais fortes para o paciente, a cura significa eliminar ou diminuir grandemente a possibilidade da cirrose ou do câncer de fígado.
O aniversario em vez de velas acessas acima do bolo nos dá como presente novos medicamentos que transformam radicalmente o panorama futuro do enfrentamento da epidemia.
Mais tardar até metade de 2015 cinco empresas farmacêuticas estarão no mercado com medicamentos orais utilizados sem interferon. Tratamentos curtos, de 8, 12 ou 16 semanas. Conhecidos como antivirais de ação direta que nos ensaios clínicos obtiveram a cura entre 83% e 100% dos pacientes, seja em pacientes nunca antes tratados ou naqueles que tinham fracassado ao tratamento com interferon.
Um panorama espetacular aparece no horizonte, que poderá acabar com a falta de especialistas que existe para o tratamento atual. Nos infectados com os genotipos 2 e 3, o tratamento respondeu de forma tão extraordinária que não teve necessidade de qualquer acompanhamento clínico ou laboratorial. Será possível, pelo menos para infectados que ainda não apresentam as complicações da cirrose, ser tratados por clínicos gerais com algum conhecimento da doença, realizando o tratamento em poucas semanas e sem necessidade de visitas ao médico durante o período. Essa é a única forma possível de poder atender os milhões de infectados, que são 170 milhões no mundo e três milhões no Brasil, faltando agora iniciar pela procura desses infectados oferecendo amplamente testes diagnósticos.
Mas nem tudo é comemoração na festa de aniversário do vírus C, pois o preço da entrada é altamente caro. Um tratamento de 12 semanas com o primeiro dos medicamentos aprovados, o sofosbuvir, custa nos Estados Unidos 84.000.- dólares. Poucos poderão pagar tanto pelo convite para entrar na festa.
Os governos estão preocupados com o preço e para tal estão outorgando priorização para avaliação e aprovação dos novos medicamentos para tratamento da hepatite C. Estados Unidos, Comunidade Européia, Japão e Canadá outorgaram “via rápida” nas solicitações dos fabricantes, objetivando que nos próximos 18 meses todos os cinco fabricantes estejam no mercado, quando então uma guerra de preços vai derrubar os absurdos preços que querem ser praticados. O Brasil por enquanto ainda não acordou para tal necessidade.
No Brasil o registro e aprovação na ANVISA para o medicamento poder ser vendido em farmácias pode levar entre seis meses e dois anos. Para ser incorporado no SUS entre preparação do protocolo, avaliação pela CONITEC, processo de compra e distribuição podem mais passar mais 2 anos. Quando se fala em judicialização da saúde é fácil observar de quem é a culpa. A demorada burocracia que faz com que passem entre mais de 2 anos, talvez quatro, para que quem depende do SUS tenha acesso a tais medicamentos levando então o paciente, como única opção para evitar a morte, recorrer ao judiciário.
Todas as empresas cientes que países pobres não poderão ter os novos medicamentos já se encontram elaborando estudos para oferecer preços diferenciados, com descontos que extraoficialmente se comenta que poderão chegar a 75%. Ainda, por serem medicamentos sintéticos serão rapidamente copiados por países que não respeitam patentes, aparecendo então medicamentos similares e acirrando ainda mais a concorrência com a consequente redução dos preços.
ACORDA BRASIL!
O Brasil foi modelo para o mundo no enfrentamento da AIDS, mas não se compreende porque está adormecido em relação a enfrentar a hepatite C, uma doença que infecta cinco vezes mais brasileiros que a AIDS. A necessidade de acelerar ações nos novos medicamentos para hepatite C, seja na priorização dos registros na ANVISA ou na incorporação no SUS, colocará o Brasil numa situação risível perante a Organização Mundial da Saúde ao demonstrar que muito se faz pela AIDS, mas no caso da hepatite C o governo está ostensivamente discriminando os infectados.
Carlos Varaldo
Presidente do Grupo Otimismo de Apoio ao Portador de Hepatite